Direitos LGBT no Brasil

Direitos LGBT no Brasil
Direitos LGBT no Brasil
Brasil
Status Legal desde 1830,[1] mesma idade de consentimento
Identidade de gênero Com cirurgia de redesignação sexual e decisão judicial permitida desde 2009, cirurgia e decisão judicial não exigidas desde 2018[2]
Serviço militar Todas as pessoas LGBT podem servir abertamente[3]
Proteções contra discriminação Proteções legais explícitas em todo o país com base na orientação sexual e identidade de gênero desde 2019
Direitos familiares
Reconhecimento de relacionamentos O casamento entre pessoas do mesmo sexo é legal em todo o país desde 2013[4][5]
Adoção Legal desde 2010[6]

O reconhecimento legal e judicial dos direitos LGBT no Brasil remonta ao Império do Brasil, quando foi uma das primeiras nações das Américas e do mundo a revogar a lei de sodomia vigente, herdada de Portugal e que proibia atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo, em 1830, durante o reinado de Dom Pedro I, quando foi promulgado o Código Penal do Império.[7] Desde a redemocratização, o Poder Legislativo tem encontrado resistência para reconhecer as principais demandas por igualdade de direitos entre LGBTs e cis-héteros.[8] Coube então ao Poder Judiciário, sobretudo a partir da década de 2010, estender direitos para a comunidade LGBT e fazer do Brasil um país avançado em direitos dessa população.[9][10][11] O Poder Executivo garantiu alguns direitos, se destacando pela criação de medidas de combate à violênca e ao preconceito.[12] No entanto, o Brasil ainda registra altos índices de violência contra pessoas LGBT;[13] em 2016, o Brasil foi referido como o país mais mortal do mundo para LGBTs pelo jornal norte-americano The New York Times.[14][15][16]

Foram propostos no Congresso Nacional nas décadas anteriores três projetos de leis que, se aprovados, elevariam a legislação brasileira ao nível de diversos países europeus no que diz respeito aos direitos LGBT. São eles: o PL 1151/1995, que propõe a autorização da união civil entre pessoas do mesmo sexo, de autoria da política Marta Suplicy,[17] o PLC 122/2006, que pedia a criminalização da homofobia e da transfobia, de autoria da política Iara Bernardi, e o PL 5002/2013, sobre o direito à identidade de gênero, de autoria dos políticos Jean Wyllys e Erika Kokay.[18] Embora tais projetos de leis nunca tenham sido aprovados pelo Congresso, esses direitos foram garantidos à população LGBT através de decisões de órgãos e instituições do Poder Judiciário. Em maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal, de forma unânime, reconheceu a união estável homoafetiva como entidade familiar[19] e, em outubro de 2011, o Superior Tribunal de Justiça afastou o óbice relativo à diversidade de sexos e determinou o prosseguimento do processo de habilitação de casamento entre duas mulheres, pois entendeu que o Código Civil de 2002 não veda expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo e não há como se enxergar uma vedação implícita ao casamento homoafetivo sem afronta a caros princípios constitucionais. Consequentemente, em maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou a Resolução n° 175, que veda a todos os cartórios do País a recusa de habilitar e celebrar casamentos entre duas pessoas do mesmo sexo e converter a união estável homoafetiva em casamento.[20] Em março de 2018, o Supremo entendeu que a identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana e, como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la.[21] Assim, a Corte autorizou a mudança do prenome e da classificação de sexo/gênero por pessoas transgênero no registro civil sem a necessidade de qualquer exigência além da manifestação de vontade do indivíduo.[22] Em junho de 2019, o Plenário do Supremo entendeu que houve omissão inconstitucional do Congresso Nacional por não editar lei que criminalize atos de homofobia e de transfobia[23] e determinou que a LGBT-fobia seja enquadrada nos crimes previstos na Lei Nº 7.716/1989 (Lei do Racismo), que prevê penas de até 5 anos de prisão, até que o Legislativo edite lei sobre a matéria.[24] Em outro julgamento de agosto de 2023, o Supremo reconheceu que atos ofensivos praticados contra pessoas da comunidade LGBT também podem ser enquadrados como crime de injúria racial.[25]

Todos os principais direitos reivindicados pela população LGBT vieram através de decisões do Judiciário, com base em interpretações da Constituição, e não do Legislativo. Sendo assim, a população LGBT brasileira não possui nenhum de seus principais direitos assegurados na lei.[26] Cabe ressaltar que a falta de legislação faz com que os LGBTs sofram tentativas de violação de seus direitos em algumas regiões do país, a exemplo do que aconteceu na 13.ª Promotoria de Justiça de Florianópolis, que chegou a impugnar mais de 100 casamentos homoafetivos sob a alegação de que a resolução do CNJ não se sobrepõe à lei (depois, todos esses casamentos foram autorizados judicialmente).[27][28][29] No julgamento do Supremo que reconheceu a união homoafetiva, o ministro-relator, Carlos Ayres Britto, disse que "a ausência de lei não é ausência de direito, até porque o direito é maior do que a lei".[30][31] Até 2017, havia 99 projetos de leis sobre direitos LGBT tramitando no Congresso (muitos sobre os mesmos temas). No mesmo período, havia outros 24 PLs contrários aos direitos LGBT em trâmite no Legislativo brasileiro, todavia, ainda que aprovadas, tais leis poderiam ter sua constitucionalidade questionada na justiça.[32][33][34] Para o advogado Paulo Iotti, que participou de diversas ações sobre direitos LGBT que foram a julgamento no Supremo, a Corte se mostra alternativa para um Congresso conservador: "O Congresso Nacional, provavelmente representando a sociedade, está cada vez mais conservador, reacionário e insensível aos direitos humanos de minorias e grupos vulneráveis. Nessa situação, o Supremo acaba sendo a última esperança da população LGBT+", disse o jurista em entrevista para o site Ponte.[35] De acordo com o ministro Dias Toffoli, "O Supremo Tribunal Federal está atento às demandas dos LGBTI+ por respeito, tratamento isonômico e inclusão social, conforme ilustram os vários julgamentos tomados por esta Corte, lastreados na dignidade da pessoa humana e no direito à igualdade".[36] Para o ministro Luís Roberto Barroso, o Supremo tem cumprido “as duas grandes missões” da Corte, de proteger as regras da democracia e os direitos fundamentais de todos.[37]

O Poder Executivo, apesar de participação pouco expressiva, garantiu direitos à população LGBT. Entre eles, destaca-se o decreto presidencial de Dilma Rousseff que permite a transgêneros usarem seu nome social em todos os órgãos públicos, autarquias e empresas estatais federais.[38] O Executivo também tem buscado enfrentar a discriminação e a violência contra LGBTs, podendo citar-se como exemplo o programa "Brasil Sem Homofobia" lançado no governo Lula.[39] Praticamente todos os presidentes brasileiros do século XXI, Fernando Henrique Cardoso,[40] Luiz Inácio Lula da Silva,[41] Dilma Rousseff[42] e Michel Temer,[43] se mostraram favoráveis aos direitos LGBT e defenderam a igualdade de direitos, sendo a única exceção Jair Bolsonaro.[44]

  1. BRASIL, Lei de 16 de dezembro de 1830.
  2. Abreu, Diego (15 de outubro de 2009). «STJ autoriza transexual a mudar nome e sexo na certidão de nascimento». g1.globo.com. Consultado em 15 de novembro de 2021. Cópia arquivada em 25 de fevereiro de 2021 
  3. Capriglione, Laura (2010). «Final feliz na caserna». blogdofavre.ig.com. Consultado em 15 de novembro de 2021. Arquivado do original em 5 de outubro de 2011 
  4. Ferreira, Gil (14 de maio de 2013). «CNJ determina que cartórios terão de reconhecer união de pessoas do mesmo sexo». CNJ. Consultado em 15 de novembro de 2021. Cópia arquivada em 15 de junho de 2013 
  5. Brocchetto, Marilia (15 de maio de 2013). «Brazilian judicial council orders notaries to recognize same-sex marriage» [Conselho judiciário brasileiro ordena que cartórios reconheçam casamento entre pessoas do mesmo sexo]. CNN (em inglês). Consultado em 15 de novembro de 2021. Cópia arquivada em 11 de abril de 2021 
  6. Matsuura, Lilian (5 de abril de 2006). «Justiça gaucha autoriza casal homossexual a adotar crianças». conjur.com.br. Consultado em 15 de novembro de 2021. Cópia arquivada em 29 de janeiro de 2021 
  7. «LIM-16-12-1830». www.planalto.gov.br. Consultado em 31 de julho de 2017 
  8. «Projetos sobre direitos LGBT caducam sem análise no Congresso». Jota. Consultado em 19 de Maio de 2024 
  9. «Pessoas trans podem adotar filhos? Essas e outras dúvidas sobre direitos trans respondidas». Terra. Consultado em 16 de Maio de 2024 
  10. «5 decisões do STF que nos últimos 11 meses mudaram a vida de LGBT». Guia Gay São Paulo. 11 de maio de 2020. Consultado em 2 de Dezembro de 2020 
  11. «Brasil é o 2º país mais avançado do globo em direitos LGBT». Guia Gay São Paulo. 17 de dezembro de 2020. Consultado em 29 de Março de 2021 
  12. «Políticas para LGBTI+ no governo federal: ascensão e queda». Nexo. Consultado em 16 de Maio de 2024 
  13. Analice Gigliotti (26 de maio de 2023). «Brasil carrega o vergonhoso título do país que mais mata LGBT+ no mundo». Veja Rio. Consultado em 15 de Agosto de 2023 
  14. «Brazil Is Confronting an Epidemic of Anti-Gay Violence» (em inglês). The New York Times. 5 de julho de 2016. Consultado em 7 de Junho de 2024 
  15. «NYT denuncia homofobia no Brasil, país mais perigoso para LGBTs». Catraca Livre. Consultado em 7 de Junho de 2024 
  16. «Brasil é o país mais perigoso para homossexuais, diz NYT». Exame. Consultado em 7 de Junho de 2024 
  17. [1]
  18. «PL 5002/2013». Câmara dos Deputados. Consultado em 29 de Novembro de 2021 
  19. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome união estável
  20. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome CasamentoG1
  21. «STF vai decidir sobre pensão previdenciária para filha solteira transexual». STF. Consultado em 16 de Maio de 2024 
  22. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome STFagenciabrasil
  23. «STF enquadra homofobia e transfobia como crimes de racismo ao reconhecer omissão legislativa». STF. Consultado em 16 de Maio de 2024 
  24. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome SupremoHomofobia
  25. «STF equipara ofensas contra pessoas LGBTQIAPN+ a crime de injúria racial». STF. Consultado em 16 de Maio de 2024 
  26. «Congresso Nacional nunca aprovou nenhuma lei voltada para direitos LGBT». Universa. Consultado em 12 de Outubro de 2020 
  27. «Promotor já pediu anulação de mais de 100 casamentos gays em Florianópolis». ND. Consultado em 1 de Novembro de 2020 
  28. «Na contramão das demais capitais, promotoria em Florianópolis se opõe a casamentos homoafetivos». G1. Consultado em 1 de Novembro de 2020 
  29. Valéria Martins. «Promotor de SC que impugnou casamentos homoafetivos não cuidará mais de uniões civis». G1. Consultado em 5 de junho de 2021 
  30. «Leia voto de Ayres Britto sobre união homoafetiva». Consultor Jurídico. 6 de maio de 2011. Consultado em 1 de julho de 2021 
  31. «Confira as frases que bombaram no Facebook do CNJ». CNJ. Consultado em 23 de Fevereiro de 2023 
  32. «24 projetos de lei propõem barrar avanços LGBTs no Brasil». Catraca Livre. Consultado em 27 de Outubro de 2020 
  33. «Casamento gay não é lei, mas é direito garantido pela Justiça; entenda». Folha de S.Paulo. Consultado em 27 de Outubro de 2020 
  34. «Proibir casamento gay afrontaria decisão do STF, avaliam especialistas». ConJur. Consultado em 27 de Outubro de 2020 
  35. Caê Vasconcelos. «Ao liberar doação de sangue, STF se confirma como 'última esperança LGBT+'». Ponte. Consultado em 8 de Junho de 2020 
  36. Alexandre Putti. «STF lança coletânea que reúne todas as decisões favoráveis aos LGBTs». Carta Capital. Consultado em 3 de Agosto de 2022 
  37. Bárbara Pombo (7 de maio de 2021). «Judiciário supre ausência de lei sobre direitos LGBT». Valor Econômico. Consultado em 5 de julho de 2021 
  38. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome decreto nome social
  39. «10 anos da política nacional de saúde LGBT: colocá-la em prática ainda é um desafio». CNN. Consultado em 16 de Maio de 2024 
  40. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome Fernando Henrique
  41. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome Lula
  42. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome Dilma
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